sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

O Direito de Construir e o Mau Uso da Propriedade

Proprietários há nesse país que sequer respeitam o direito de seus inquilinos. Causam-lhes prejuízos psicológicos, de ordem emocional e material. O direito de construir não pode servir como arma para que o outro se sinta constrangido a sair do imóvel locado e pagar a multa rescisória. Nesse sentido, cabíveis as medidas judiciais que estão arroladas no Código Civil e Código de Processo Civil.

"A construção de prédio pelo proprietário é direito seu, inserido no ius fruendi. No entento, em prol da comunidade, da vizinhança e do interesse público não é direito absoluto, como em outros aspectos da propriedade. O próprio Código Civil, no art. 1299 (antigo, art. 572), descreve a modalidade genérica de exercício restrito desse direito: 'O proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos'" (VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direitos reais. 3ª ed. volume 5. São Paulo: Atlas, 2003, p. 359-360) .

Assim, a propriedade deve cumprir a sua função social, tendo por regra o direito de construir e a exceção a sua limitação, quando a construção afeta a direito alheio. Os dispositivos legais "(...) reprimem o mau uso ou uso anormal da propriedade, quando ocasiona prejuízo à segurança, sossego e saúde da vizinhança" (VENOSA, Ob. Cit., p. 360).
 
Quando o proprietário gera ao inquilino um dano moral decorrente de construção que prejudica o bem estar da família deste, restam por cabíveis as ações judiciais em espécie, conforme acentua o artigo 1277 e § único, do Novo Código Civil:

"O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha(...). Proíbem-se as interferências considerando-se a natureza da utilização, a localização do prédio, atendidas as normas que distribuem as edificações em zonas, e os limites ordinários de tolerância dos moradores da vizinhança ".
Os seguintes meios processuais são cabíveis em caso de violação de direitos de vizinhança: 

  •        A ação demolitória que objetiva a demolição da construção que ameaçar ruína ou  construção que violar direito de vizinhança. Consoante artigos 1.280 e 1.312 do Código Civil: 
 
 Art. 1.280: O proprietário ou o possuidor tem direito a exigir do dono do prédio vizinho a demolição, ou a reparação deste, quando ameace ruína, bem como que lhe preste caução pelo dano iminente.
Art. 1.312: Todo aquele que violar as proibições estabelecidas nesta Seção é obrigado a demolir as construções feitas, respondendo por perdas e danos.
  • A ação de dano infecto com o escopo de proteger a segurança, sossego e saúde dos vizinhos que residem nas proximidades de determinado imóvel. Artigo 1.277 do Código Civil, Verbis:
"O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha.
Parágrafo único: Proíbem-se as interferências considerando-se a natureza da utilização, a localização do prédio, atendidas as normas que distribuem as edificações em zonas e os limites ordinários de tolerância dos moradores da vizinhança".

"A ação de dano infecto refere-se àqueles casos em que o proprietário ou o possuidor sofram com a turbação que lhes é impingida, conforme anota Gediel:
A ação de dano infecto tem cabimento naquelas situações em que o proprietário ou possuidor de um imóvel esteja sofrendo, ou tenha justo receio de sofrer, dano ou prejuízo pelo uso nocivo (barulho excessivo, desordem, criação de animais, armazenagem de produtos perigosos, tais como explosivos e inflamáveis, exalações fétidas etc.) ou ruína, de prédio vizinho. Seu objetivo primordial é cominar pena ao proprietário do prédio vizinho, até que cesse a situação que fundamenta o pedido, ou a prestação de caução pelo dano iminente."(Gediel Claudino de Araujo Júnior, Prática no Processo Civil, p. 140)

"Diante da situação, aquele que se sentir prejudicado, ou tiver justo receio de sê-lo, poderá ingressar com a ação de dano infecto para obter a sentença que reconheça uma obrigação (de fazer) do réu para eliminar o incômodo ou (de não fazer) para que o réu abstenha-se da prática de atos que causem o incômodo ou a situação de risco

Como a ação de dano infecto não possui previsão na legislação processual, seguirá o procedimento comum ordinário ou sumário, conforme o valor da causa, tendo como pressuposto o art. 461 do CPC, que assim se expressa:

Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.
§ 1º - A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.
§ 2º - A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa (art. 287).
§ 3º - Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada.
§ 4º - O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.
§ 5º - Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.
§ 6º - O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva.
Como se infere do texto legal, poderá ser imposta ao réu, de acordo com o § 4º do artigo acima transcrito, uma multa diária, conhecida como astreinte, que tem por objetivo obrigar o réu a cumprir a obrigação na forma específica, e não obrigá-lo a pagar tal multa, por isso deve o magistrado quando for arbitrar o seu valor, fixá-lo em valor considerável, para que o réu não veja como alternativa mais viável o pagamento da multa, mas o cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, conforme o pedido do autor.

A caução de dano infecto poderá ser requerida em quaisquer situações em que persistam a iminência ou permanência do dano pela execução de obra ou pelos atos praticados nos imóveis vizinhos, mesmo depois de ajuizada qualquer ação de vizinhança.
  
  • Nunciação de obra nova é uma ação de natureza cominatória, expressa nos artigos 934 a 945 do Código de Processo Civil, e compete, segundo o artigo 934:
Com fundamento material no Código Civil de 2002, art. 1.299, e embasamento processual, no CPC, art. 275, II, alínea “c”, que dispõe sobre o rito sumário, a ação indenizatória é, quiçá, a mais freqüente entre as ações de vizinhança.

I - ao proprietário ou possuidor, a fim de impedir que a edificação de obra nova em imóvel vizinho lhe prejudique o prédio, suas servidões ou fins a que é destinado;
II - ao condômino, para impedir que o co-proprietário execute alguma obra com prejuízo ou alteração da coisa comum;
III - ao Município, a fim de impedir que o particular construa em contravenção da lei, do regulamento ou de postura.

Não obstante à clareza da lei sobre os aspectos contidos na legislação processual, Sílvio Venosa comenta sobre o uso e hipóteses dessa medida:

Cuida-se de ofensa à posse por obra vizinha. Essa ofensa depende do exame de posturas oficiais, de exigências impostas pelo loteador ou de simples regras de vizinhança. A edificação em curso deve prejudicar o prédio, suas servidões ou finalidades. Deve ser ajuizada no curso da obra. Trata-se de ação que visa a aspectos materiais. A obra em si. Se já terminada, não mais é cabível essa ação. Nesse caso, a ação para desfazer a coisa é a obrigação de fazer com preceito cominatório, pelo procedimento comum. A nunciação é também uma ação preventiva, perante ameaça de ofensa à posse. Cabe tanto ao possuidor direto, quanto ao indireto. Não se nega, portanto, legitimidade ao locatário que vê o imóvel locado ameaçado por obra próxima. A legitimidade pode ser concorrente tanto do dono do imóvel, como do locatário, nessa hipótese. 

Pontes de Miranda explica que a obra deve ter sido iniciada e não concluída, considerando-se iniciada quando comprovado o depósito de materiais de construção ou a abertura de fundações. Se apenas estiver na intenção do proprietário fazê-la, não deve ser considerada como iniciada, mas se o vizinho percebe, por exemplo, a chegada de caminhões de pedras, e o terreno não tem capacidade para suportar o peso, configura-se o risco. “O temor é o de pessoa razoável diante dos fatos que já existem”

De acordo com Professor Elpídio Donizetti, a ação de nunciação de obra nova não traz como pressuposto a posse, motivo pelo qual não consta no rol das ações possessórias, todavia, o uso dessa ação permite ao proprietário ou possuidor exercitar a defesa de sua posse, mas especificamente para impedir que a edificação em prédio vizinho cause danos ao imóvel de sua propriedade ou no qual esteja na posse.

Luiz Rodrigues Wambier observa que o fundamento da ação de nunciação de obra nova é o direito de propriedade, orientando que o objetivo de tal ação é não permitir o abuso do direito de construir. Tem o proprietário ou possuidor, segundo este autor, por meio da ação de nunciação de obra nova, o direito de obstar a construção capaz de interferir de maneira anormal no imóvel de que detém a posse ou a propriedade. É meio de criar obstáculo ao andamento da obra nociva.

Cabe dizer, de maneira a conceituar, que “obra nova” não significa simplesmente uma obra de construção, mas, além desta, qualquer alteração em imóvel, reforma, demolição, escavação, serviços de terraplanagem, pintura, podendo ser ainda colheitas, extração de minérios, corte de madeira, etc. A obra deve ter se iniciado e não ser concluída.

Relativamente à legitimidade passiva, salienta-se que no pólo passivo estará sempre o dono da obra, não necessariamente o proprietário do terreno, porquanto há a possibilidade de edificação em terreno alheio, observa-se, porém, que o legitimado passivo deve ser o beneficiado pela obra.

Inobstante a possibilidade de concessão de liminar na ação de nunciação de obra nova, havendo urgência da medida, em determinados casos, o art. 935 do Estatuto Processual autoriza a antecipação da tutela antes mesmo de se propor a ação, que é alcançada por meio do embargo extrajudicial, promovido de forma verbal na presença de duas testemunhas, devendo este ser ratificado em juízo, através da petição inicial da ação de nunciação de obra nova, no prazo de três dias, para que adquira força de ato judicial, sob pena de ter seu efeito cessado.

Na falta do embargo extrajudicial, o autor poderá mesmo assim requerer a concessão de medida liminar através na mesma petição inicial com que se inicia a ação de nunciação de obra nova. Ressalte-se que o embargo extrajudicial será homologado imediatamente apenas se houver prova documental ou testemunhal, neste último caso, após a justificação com a presença das testemunhas presentes quando da notificação verbal feita pelo autor. 

De acordo com o art. 936 do CPC, o pedido principal na ação de nunciação (que é a suspensão da obra nociva e o desfazimento do que está prejudicando o autor), pode ser cumulado com o pedido de cominação de pena e condenação em perdas e danos.

A finalidade principal da ação é interromper a obra danosa, motivo pelo qual se faz necessário o pedido liminar. Sem este, a ação não seria um remédio preventivo, mas exclusivamente curativo, transformando-se em mera ação demolitória com respectiva condenação do réu por perdas e danos. A cominação de pena complementa o pedido de embargo liminar em caso de prosseguimento na obra embargada.

Para a propositura da ação é necessária a petição inicial com os requisitos do artigo 282 do CPC, independente de embargo extrajudicial, podendo ser cumulado com os pedidos de cominação de pena pecuniária e condenação em perdas e danos de acordo com o art. 936 do mesmo Código.

Os documentos que deverão acompanhar a exordial são: a) prova da propriedade, posse ou condomínio; e b) documentos probatórios do prejuízo (fotografias, plantas ou laudos extrajudiciais, etc.). Não havendo documentos para instruir a petição inicial, poderá o autor requerer a justificação prevista no art. 937 da carta processual.

Após a concessão da liminar ou a homologação do embargo extrajudicial, o oficial de justiça cumprirá a determinação do magistrado, lavrando auto circunstanciado no local da obra, descrevendo seu estado atual e intimando o construtor e os operários que ali se encontram para que não a prossigam sob pena de desobediência. A citação do dono da obra, na qual constará o prazo de cinco dias para a resposta que será feita em seguida, conforme reza o art. 938, e a ausência de contestação dentro do prazo imporão ao réu os efeitos da revelia, de acordo com o art. 803.

O parágrafo único do artigo 803 do Código de Processo Civil informa que se o réu apresentar contestação, observado o prazo legal, será designada audiência de instrução e julgamento.

O artigo 940 permite ao nunciado, todavia, requerer, em qualquer grau de jurisdição, o prosseguimento da obra, bastando que preste caução e demonstre o prejuízo da sua paralisação, que não poderá ser prejuízo pessoal, mas de danos que poderão ser causados à própria obra, se suspensa.

A caução referente à nunciação de obra nova é a mesma abordada na ação de dano infecto, poderá ser real ou fidejussória, de acordo com o parágrafo 1º do mencionado artigo, deverá ser prestada no juízo de origem da ação, mesmo que esteja em grau de recurso.
        
Não menos importante é a previsão do parágrafo 2º do artigo 940, que proíbe em quaisquer circunstâncias o prosseguimento da obra quando ela atentar contra regulamentos administrativos.

Dispõe o artigo 1.299 do CC que “O proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos.”

O CPC prevê a ação de indenização para ressarcimento por danos causados em prédio urbano e rústico, observando-se o procedimento sumário, independentemente do valor da causa.

Nada obsta, no entanto, que uma ação indenizatória para ressarcimento dos danos materiais ou morais, seja cumulada com outras ações abordadas nesse capítulo, como a ação demolitória, ação de dano infecto ou a ação de nunciação de obra nova." (Fonte: www.jurisway.org.br, autor: Luiz Henrique Franco Ribeiro).

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