domingo, 21 de fevereiro de 2016

OS NOVOS BÁRBAROS, COMO O IMPÉRIO (DO MAL) LIDA COM ELES?

Nesse sentido, venho folheando um livro interessante que se compagina com o curso do ILB de Relações Internacionais Teoria e História e que fornece algumas informações acerca da nova formatação de mundo, a "Nova Ordem Mundial". 

Trata-se de "O Império e os Novos Bárbaros" de Jean-Christophe Rufin, da Editora Bibliex, 1996. As páginas introdutórias fornecem a base do que tem sido o "Império" do Norte perante o Sul.

"A partir do momento em que o Norte não mais se reconhece como universal - por meio da luta de alcance planetário de seus componentes Leste e Oeste -, a História passa a existir apenas dentro de um limite, aquele que separa o Norte do Sul. Tudo o que está além desse limite perde sentido". (RUFIN, Jean-Christophe. O Império e os Novos Bárbaros. Trad. André Amado, 3° Edição. Rio de Janeiro: Bibliex, 1996, p. 127).

Há uma correlação de ideologia quando se diz que os romanos, em seis séculos de império, buscavam "catequizar" os povos bárbaros trazendo-os para o seu lado, tanto no que se refere à cultura quanto no que diz respeito ao modo de viver. Ocorre que o eixo de dominação decorria do leste para o oeste.

"Em todos os domínios, Império e barbárie formam binômios contrários. Roma se vê garante da paz e da harmonia; os bárbaros guerreiam sem parar. Ela é uma república onde governa o povo; eles obedecem a monarquias violentas. Ela está unida por sua cultura e sua língua; eles estão pulverizados e não se entendem. Ela é racional e sua religião contribui para a ordem da cidade; eles são fustigados pelo fanatismo. Ela pratica a justiça e respeita o direito; eles só são contidos pela força." (RUFIN, Jean-Christophe. O Império e os Novos Bárbaros. Trad. André Amado, 3° Edição. Rio de Janeiro: Bibliex, 1996, p. 24)

Os bárbaros modernos somos nós do sul ("atrasados") que os povos do norte buscam dominar, ideologizando-nos a seu modo.

Ademais, para "(...) o Norte, o Sul aparece, hoje, como uma espécie de lata de lixo gigantesca de ideologias obsoletas, que lá crescem na maior incoerência, como réplicas monstruosas ou caricaturas de seus originais".(p. 85)

Destarte, as ideologias são aqui transformadas, processadas de outras formas, tais como as religiões evangélicas que conhecemos e suas diversas denominações que já naufragaram no continente europeu, aqui tomam força com vida própria, cheias de mistérios surpreendentes, ao passo que se "depaupera na Europa, encontra às vezes um vigor extemporâneo no Sul". (p. 84)

"É preciso opor-se energicamente a essa opinião. Essa visão é falsa, superficial e impede uma compreensão mais profunda das verdadeiras evoluções ideológicas no Sul. Ela tudo reduz à passividade e só vê uma civilização da cópia - cópia sofisticada (...). O Sul não se contenta em imitar, mesmo quando capta as influências vindas da Europa e dos Estados Unidos; ele transforma e cria" (Idem).

Penso, assim, que somos os bárbaros não no sentido da falta de civilidade, ou mesmo no quesito falta de originalidade de pensamento próprio, já que na natureza nada se cria, mas se transforma da mesma maneira acontece com o pensamento e com a ideologia (não seria uma quimera, mas sim um modo diferente, um ponto de vista diverso, aplicável a objetos, pessoas ou situações diversas), aqui o bárbaro é visto como o diverso do padrão. Aquele eleito pelos povos do norte.

"O verdadeiro conflito entre o Norte e os novos bárbaros não é o que se exprime ruidosa e particularmente nesta ou naquela disputa. É a nova imagem de conjunto do Terceiro Mundo que se vai consolidando nos domínios demográfico, econômico, político e cultural. Depois de trinta anos de guerra fria e de enfrentamento Leste/Oeste sob os trópicos, a hora em todos os setores e de adiantamento. O mito do desenvolvimento por primeira vez desponta e deixa entrever uma realidade há muito dissimulada: Sul e Norte não mantém uma relação de avanço ou atraso. Evoluem em sentido contrário. (...) A nova fronteira contemporânea entre o Norte e o Sul marca o advento paulatino de uma moral da desigualdade, de uma espécie de apartheid mundial. Na ideia de fronteira, há de maneira mais ou menos implícita a intenção de definir e proteger a civilização do Norte. Mas ao preço do abandono violento do Sul, identificado com a barbárie. Esse abandono já hoje em dia é perceptível em vários domínios. Demográfico: substituição da ambição de limitar a população mundial por uma esperança mínima, a de conter as massas do Sul e transferir aos flagelos malthusianos a responsabilidade por seu controle. Econômico: substituição do ideal universal de desenvolvimento por uma política seletiva de só assistir aos Estados-tampão, àqueles situados ao longo da fronteira, que devem assegurar sua estabilidade. Político: substituição do apoio universal à democracia por uma complacência nova em relação aos Estados totalitários do Terceiro Mundo (China, Irã) desde que se revelem capazes de contribuir para a estabilidade regional e, sobretudo, de impedir movimentos migratórios maciços. Militar: substituição do envolvimento direto e excessivo das grandes potências nas guerras do Terceiro Mundo por uma diferença de tratamento de acordo com a localização dos conflitos. Os que se localizarem sobre a fronteira suscitam intervenção maciça do Norte. Os outros exibem à opinião indiferente o espetáculo gratuito de massacres nesse sentido. A ideologia da fronteira marca, assim, uma formidável contração de terras históricas."(RUFIN, Jean-Christophe. O Império e os Novos Bárbaros. Trad. André Amado, 3° Edição. Rio de Janeiro: Bibliex, 1996, p. 24-26). 

Destarte, o "império do mal" desenha a sua força, no sentido de barbarizar o sul. Quando não o faz por meio de guerras e assassinatos, pleiteia a mente dos incautos sulistas. O mundo está dominado pelo Norte que escraviza o Sul ao seu modo.